Tem como recuperar o dinheiro do Bolsa Família usado em apostas online? Entenda
Milhares de beneficiários que usaram o Bolsa Família para apostar em bets estão tentando reaver os pagamentos que perderam.
O uso do Bolsa Família em plataformas de apostas online acendeu um sinal de alerta em todo o país. Milhares de famílias, amparadas por esse benefício criado para garantir segurança alimentar e dignidade básica, acabaram direcionando parte dos recursos para casas de apostas digitais, conhecidas como “bets”.
A situação, além de delicada, expõe um problema estrutural: a combinação entre vulnerabilidade social, promessas de dinheiro fácil e ausência de barreiras tecnológicas que restrinjam esse tipo de gasto. Ou seja, o combo do terror estava formado.
Esse comportamento, embora individual, também reflete pressões econômicas e sociais, agravadas pela publicidade intensa dessas plataformas. Diante disso, a sociedade discute não apenas a necessidade de maior controle sobre essas empresas, mas também o direito à reparação dos recursos públicos.

Neste artigo, você vai ver:
Beneficiários do Bolsa Família querem recuperar dinheiro de apostas
Organizações da sociedade civil entraram com uma ação judicial na tentativa de reaver os valores apostados por beneficiários do Bolsa Família. O processo, protocolado na 13ª Vara Cível Federal de São Paulo, segue em fase inicial e aguarda o despacho de tutela de urgência por parte da Justiça.
A ação foi movida pela Educafro e pelo Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedeca), com apoio jurídico do advogado Márlon Reis. Embora o pedido tenha sido feito em 22 de maio, ainda não há prazo para decisão judicial, tampouco previsão para eventual devolução dos recursos.
A ação cobra que essas plataformas desenvolvam sistemas seguros para impedir que beneficiários do Cadastro Único consigam se cadastrar ou utilizar seus dados para jogos. Além disso, solicita campanhas informativas e educativas sobre o uso consciente de recursos assistenciais e aplicação de multa.
As entidades também exigem a suspensão das atividades das operadoras que não se adequarem. O principal argumento jurídico é de que o dinheiro público foi desviado de sua finalidade original, comprometendo a política pública de combate à pobreza.
Mesmo com a responsabilidade individual dos jogadores, especialistas apontam que a estrutura em que essas decisões acontecem precisa ser considerada. Em contextos de vulnerabilidade econômica, baixos níveis educacionais e intensa propaganda, o risco de comportamento compulsivo aumenta.
Por isso, o processo não trata apenas de recuperar valores, mas também de corrigir práticas abusivas de empresas que lucram com a fragilidade alheia. A responsabilização das plataformas pode abrir precedentes para mudanças na regulação do setor e proteção das camadas mais pobres da população.
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Quanto os beneficiários do Bolsa Família gastaram com as bets?
Em agosto de 2024, o Banco Central identificou que R$ 3 bilhões do Bolsa Família foram direcionados a casas de apostas online. O montante causou indignação pública e motivou uma investigação da Polícia Federal, ainda em andamento.
O Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) solicitou a apuração ao perceber que 1,8 milhão de beneficiários haviam utilizado cartões do programa em sites de apostas. O número levanta suspeitas sobre possíveis fraudes, em que pessoas utilizariam os dados de forma indevida no mercado de jogos.
Os R$ 3 bilhões mencionados representam mais do que apenas uma cifra impactante. Com esse valor, seria possível comprar 3,3 milhões de cestas básicas em São Paulo, segundo o Dieese, com potencial para atender 92,5% das famílias cadastradas no Bolsa Família nas 27 capitais do país.
Além disso, com esse mesmo recurso, o governo poderia construir 476 Unidades Básicas de Saúde (UBS) completas, cada uma com capacidade para atender até 500 mil pessoas por mês. Isso ilustra como o desvio desses recursos compromete serviços essenciais para a população.
O problema tende a crescer, considerando a evolução do mercado de apostas. Entre agosto de 2024 e abril de 2025, esse setor saltou de um faturamento mensal de R$ 20,8 bilhões para R$ 30 bilhões, segundo o BC.
Se a proporção de 14,4% dos recursos oriundos do Bolsa Família for mantida, o gasto mensal pode ter ultrapassado os R$ 4,3 bilhões — um valor ainda não confirmado oficialmente, mas que, se comprovado, indica uma ampliação crítica da perda de recursos públicos.
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Tem como recuperar dinheiro?
Atualmente, os beneficiários que perderam dinheiro em bets ainda não têm garantia de reembolso. A ação civil pública movida pelas entidades sociais ainda não obteve decisão favorável, estando na fase preliminar de análise.
O juiz federal Marcelo Guerra Martins deve definir se concede a tutela de urgência para bloquear cadastros e contas vinculadas a beneficiários, bem como determinar o ressarcimento dos valores utilizados. No entanto, mesmo que a Justiça acate os pedidos, o processo pode se estender por anos.
Além disso, a devolução de valores depende de diversos fatores, como o rastreamento das transações e a responsabilização das operadoras. Como muitas dessas empresas têm sede fora do país, a cooperação internacional se torna necessária.
Isso complica a recuperação dos recursos, mesmo que a Justiça brasileira determine a restituição. Outro entrave está na ausência de mecanismos específicos que obriguem as plataformas a identificar beneficiários de programas sociais, já que hoje não existe um filtro que bloqueie as operações.
Por fim, a possibilidade de recuperação integral dos valores apostados ainda esbarra em questões políticas e técnicas. A Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda estuda a criação de medidas que atendam à decisão do STF, que exige ações concretas para impedir o uso dos recursos.
No entanto, essas medidas ainda estão em fase de análise técnica e jurídica. Enquanto isso, cresce o debate sobre como proteger financeiramente as famílias em situação de vulnerabilidade e evitar que o Bolsa Família, essencial para a sobrevivência de milhões, continue sendo drenado para as apostas.
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